sábado, 30 de novembro de 2013

Porsche 911 em Interlagos

Os dois 911 no S do Senna (Se você é o autor desta foto por favor entre em contato)
Às vezes a gente dá sorte na vida. No ultimo dia 11 de setembro a promotora de eventos carioca Oktane fechou o Autódromo de  Interlagos para um track day e o destino através de uma pessoa sensacional e que é uma dos meus seres humanos preferidos resolveu me dar um presente gigantesco, sensacional, muito provavelmente o melhor de todos. Juro que eu só pedi para dar uma voltinha em um Porsche 911(996) Carrera 4 (lindamente azul marinho), na rua mesmo. Mas ele me foi oferecido para uso exclusivo durante o track day da Oktane. Coincidentemente, o dia era 11 de setembro. Nos Estados Unidos da América se referem a este dia como nine-eleven exatamente como também se referem ao melhor carro esporte de todos os tempos, o cinquentão inigualável Porsche 911 (Nine Eleven).

Fui buscar o carro em Campinas na terça à noite e trouxe ele para casa para poder chegar bem cedo a Interlagos na quarta evitando assim o trânsito parado da Marginal Pinheiros e o eventual risco de assalto, ou você acha que vivemos em um país seguro? Mas de qualquer jeito foi uma ótima oportunidade para comparar o mítico 911 com o meu repertório diário de referências de uso do carro.

O Porsche me foi entregue por um funcionário do dono dele, então não teve briefing. Meio assustador, mas fiquei muito honrado com a confiança depositada em mim. Então lá fui eu perder minha virgindade de novo, era exatamente esta a sensação, a ansiedade extrema, a noite anterior mal dormida...

As primeiras impressões me disseram que os carros atuais estão nos deixando delicadinhos demais!!! Eu me achava ridículo por estranhar os comandos do 911, todos eles eram pesados na minha opinião. Trambulador, embreagem, freio e acelerador, ainda que este último seja bastante sensível ao curso, mas tem que fazer força para ele começar a se movimentar. Mesmo o dono que já tem intimidade com o carro não consegue manobrar o 996 discretamente. A rotação do motor sempre dá um pulo ao sair da marcha lenta mesmo com pequeno ângulo de acionamento do pedal... aí você manobra ele meio nas latidas, mas isso é puro deleite porque o ronco deste carro é espetacular. Resumindo, no primeiro contato tomei um “pedala” do 911.

Bom, saí com o Porsche meio me borrando as calças, mas logo deu pra ver que não tem nada de extraterrestre nele. É um carro. Mas é o melhor carro que já dirigi. Em poucos quilômetros me acostumei. Não é muito grande e não tive a impressão de estar muito baixo também. Só parecia que tudo estava correto, do jeito que tem de estar. As marchas bem escalonadas, a alavanca mexe o quanto tem de mexer, freios previsíveis, o motor com torque suficiente para a vida mundana, sempre, desde baixas rotações. Dá para andar com ele de maneira tranquila, ainda que nestes primeiros quilômetros eu achei difícil ser totalmente suave. A resposta era sempre um pouco mais brusca do que eu esperava, mas isso é normal nos meus primeiros quilômetros com qualquer carro. A autocrítica é forte. Um aspecto que me impressionou muito positivamente: a suspensão não é dura. Não é um tapete voador, ela transmite o que tem no chão, mas sem te judiar.

A direção hidráulica parece que é mecânica quando em movimento. Duvido que exista um carro que eu me dê tão bem como me dei como o 911 assim de cara. Recentemente dirigi um BMW 528 e um M3 em Interlagos e posso dizer que este começo de relacionamento não foi a mesma coisa. O M3 andava bem mais com 120hp extras mas não me senti tão bem nele como me senti no 911. Subjetivo? Sim, muito!

Peguei a rodovia com tranquilidade, pois na saída de Campinas há um radar em cima do outro na Rodovia Dom Pedro. Chego ao anel viário e o trânsito dá uma tranquilizada. Fico treinando alternar marchas mantendo a velocidade para me familiarizar com o carro, ele vai me ensinado como gosta de conversar. Ao chegar na Rodovia Anhanguera dou a primeira cutucada no pedal da direita, em segunda marcha....Que sensação!! O ronco é forte assim como a aceleração. Me contenho. É fácil pulverizar os limites de velocidade neste carro. Aliás tenho de me manter atento para permanecer dentro da legalidade. O transito volta a ficar intenso o que é bom e ruim. Não posso encher o peito do 911, mas fica mais fácil se manter dentro da lei.
Resolvo tentar a Rodovia dos Bandeirantes. Péssima ideia. Parece não haver lei por ali, caminhões protagonizando todos os tipos de barbaridades. Abortei os planos e 13km depois retornei para a Anhanguera, mais tranquila nestes 48 quilômetros finais. Consigo andar mais solto agora. Mesmo em 6ª marcha a velocidade aumenta facilmente. Posso dizer que a velocidade de cruzeiro do 911 é mais de 50% acima do limite. Ele vai tranquilo, sem barulho de vento, sem pisar muito. Quando a estrada permite ele estica suas pernas até os 150 ou 160km/h de maneira serena sem riscos. Óbviamente eu deixava a velocidade cair suavemente ao perceber um veículo à frente. Não imaginava que o 911 era um estradeiro tão competente, achava que ele era muito agitado, te cutucando toda hora, como um cavalo bravo, mas não, se você quiser ele pode ser um competente GT.

Chego a São Paulo e já estou amigo do alemão, já estou conduzindo ele de maneira mais intuitiva. Nada como pegar estrada com um carro para conhecê-lo melhor. Na Marginal Tietê ele se mostra um carro de verdade... encara o asfalto ruim sem frecuras... não há batidas secas nem trancos nas ondulações, como eu conheço bem o trecho desvio das tampas de bueiros e dos buracos. Chego em casa em entro na garagem sem dramas, estava morrendo de medo de raspar na guia rebaixada, nada.
Chegando na garagem um problema, cadê a ré? Olho a alavanca de cambio que indica a ré ao lado da primeira marcha. Aperto a alavanca para baixo e nada, forço para a esquerda e nada. Que medo de quebrar alguma coisa!! Aumento a força para a esquerda, nada, aumento mais a força e a alavanca vence um trava. Me senti, novamente, uma menininha. Tomei mais um “pedala” do 911, se você quer engatar a ré, tem de fazer força para não haver engate acidental, simples e brilhante.

Manobro ele, alinho com a vaga mas devido ao longo balanço traseiro do 911 faço a aproximação final na mão mesmo. Consigo um perfeito estacionamento na minha pequena vaga.
Pouco à vontade na vaga da garagem

No dia seguinte às 6h13 eu estou descendo da guia rebaixada, rumo ao Autódromo Inernacional Jose Carlos Pace, vulgo Interlagos. Saio sem tomar café da manhã a ansiedade espanta o sono. Completo o tanque com a mais pura gasolina Podium. E vamos embora. Pego um pouco de trânsito na marginal Pinheiros da ponte do Morumbi até a ponte Transamérica. Mas mesmo assim chego cedo demais, a pista abre às 8h00. Paro no posto BR da avenida Interlagos e tomo um sensacional chocolate quente sabor Alpino da Nestlé. Me sinto na Europa. “Meu” belo Porsche 911 azul marinho parado em frente à loja de conveniência. Um sol ameno, bem gostoso, espantando o frio da manhã. Hora de ir para a pista.

Chego lá estaciono meu amigo azul nas vagas de visitantes, no lado externo do Paddock. Espero meu mecenas, patrono desta experiência sensacional. Ele iria chegar em outro Porsche um sensacional 911 GTS (997) amarelo calçado com semislicks Pirelli Trofeo R bem mais apropriados para o dia de “fitness” do que os Michelins do “meu” 996.

Na hora de fazer inscrição recebo a péssima noticia que não há vaga para eu participar do evento. Deixo meu nome na lista de espera e começo a “zicar” todo mundo menos meu mecenas. Não precisa, depois de três horas de espera liberam minha entrada.

Como é minha primeira vez em Interlagos sem supervisão, meu patrono vai na frente no amarelão me mostrando o circuito. Eu estava realizando um sonho, parecia que eu havia me transportado para dentro do game Gran Turismo: “License 16 – Guided Lap of Interlagos”. Ia observando e imitando os pontos de freada do GTS, mas de cara já levei algumas mordidas do azulão.... tive de ir adaptando minha tocada gradualmente. Depois de algumas voltas voltamos aos boxes e cometi um erro, pedi para acertarem as pressões dos pneus. Deixaram murcho demais. O carro passou a não me avisar mais nada, eu tinha de adivinhar quando ele ia sair. Meu melhor tempo nestas voltas tinha sido 2'11”, o tempo do carro com o dono ao volante e com um jogo velho de pneus. Eu estava de pneus novos, o que não é ótimo, mas era definitivamente melhor do que o jogo anterior de pneus. Eu não estava satisfeito com este tempo, sentia que eu estava atrapalhando mais do que ajudando o alemão a fazer o serviço.

Mais tarde naquele dia voltei à pista mais duas vezes e o resultado foi praticamente o mesmo, eu e o 911 brigando entre a gente nas curvas de baixa e o tempo da volta melhorou somente 1”, agora minha melhor marca era 2'10”. “Não é pra ser assim pensei comigo”. Foi naquele momento que as dezenas de milhares de quilômetros virtuais e as incontáveis horas de leitura sobre porsches serviram para alguma coisa. Jogando videogame aprendi que muito mais importante do que a entrada da curva era a saída, quanto mais rápido se sai de uma curva, mais rápido se percorre a reta até a próxima curva e assim que se faz um bom tempo num autódromo. Saio para a pista para a última sessão de voltas, e ofereço a você, amigo leitor, uma carona dentro do meu capacete.

Quanto à volta vou ser bem sincero, meu cérebro estava bastante sobrecarregado então fui meio de ouvido nas tocadas e não olhei a velocidade nenhuma vez, então não vou conseguir falar direitinho as velocidades em cada trecho. O conta giros gigante não tinha muito como não olhar, então vou cutucar os neurônios aqui e tentar descrever a melhor volta que eu fiz em Interlagos que, foi a minha última volta rápida neste dia sensacional, o momento que eu me entendi com o 911. Espero que você goste.

Ao fim da zebra do mergulho aplico os freios, escuto o ronco diminuir e em mais um punta-tacco delicioso reduzo para segunda marcha. Solto os freios e deixo o alemão se equilibrar, como diz a lenda Vic Elford, você tem de seduzir o 911 para ele fazer o que você quer, se não for de maneira suave ele vai te punir.

Entro na curva da junção beliscando a zebra do lado de dentro e deixando ele usar o espaço da pista em direção à grande zebra do lado direito sem subir nela. Vou desvirando o volante enquanto aperto o acelerador, o ronco aumenta, no momento exato, agora já mais íntimo com o carro, olho para o conta giros e vejo o ponteiro mergulhando em direção àquele grande número 7. Coloco terceira e contorno a curva do café, na saída o 911 pede a 4ª, ele recebe, não adianta afobar muito a mudança, a coisa tem o ritmo natural, o trambulador duro não deixa eu ser muito ágil, mas a coisa sai no tempo certo não há tranco mesmo soltando a embreagem rapidamente. Como diz o dono do carro: "Ele vai te ensinar o ofício". Bem na entrada dos boxes ele pede quinta marcha. Passamos na linha dos boxes já de olho na placa dos 150m, ele atinge 215km/h antes de começar a freada.

"Buoooh" 4ª, "buooh" 3ª , "buooh" 2ª, o entro no S do Senna um pouco atrasado, termino a primeira perna bem no meio da pista, na minúscula reta em descida o carro já pede terceira marcha, coloco enquanto aponto o carro para a zebra interna à segunda perna do S já acelerando o seis cilindros. Faço a curva do sol com o pé trancado no fundo... a aderência nesta curva impressiona, impossível não usar o clichê, o carro parece mesmo estar sobre trilhos. Saindo da curva do sol o carro pede 4ª marcha e devora toda a reta oposta, quando parece que a 5ª será necessária chega o ponto de freada. Redução para terceira, solto o freio para ele se equilibrar e entro na curva do lago já acelerando de leve. O alemão agradece e cravo o pé assim que ele fica paralelo à zebra. Na tangência da Chico Landi coloco a quarta só para alguns segundos e já estamos entrando no laranjinha...

Freada leve e redução para terceira, faço o laranjinha mantendo o giro, passo perto da primeira zebra interna e mordo de leve a segunda, uma pisadinha curta no acelerador e freada e redução para segunda marcha, fico sem espaço para deixar ele se equilibrar para entrar no S, lembrar do Vic Elford? Pois é lá se vai a traseira, e devido à calibragem errada dos pneus não há aviso algum. Nada muito dramático mas perco um tempinho até colocar a casa em ordem.

O Pinheirinho é contornado sem dramas e acelero na saída sentindo que não posso afundar todo o pé até desvirar todo o volante. Me empolgo e coloco terceira enquanto o posto de bandeirinha se aproxima rápido. Freio um pouco tarde e novamente não tenho espaço para deixar ele se acalmar antes de entrar no bico de pato, sinto ele se desequilibrar, mas a traseira não sai tanto desta vez, acelero novamente e coloco a terceira cedo, antes de entrar no mergulho, não sinto confiança em mudar de marcha durante esta curva. Faço o mergulho tentando achar o limite do carro, não acho. No final da zebra aplico os freios e sobra espaço para deixar ele se assentar desta vez, faço a junção igualzinho fiz na volta anterior e posso pedir tudo do boxer 6 cilindros na subida, já em terceira marcha.

Esta é uma memória que vou levar comigo para o túmulo, o ronco deste carro subindo a junção de Interlagos, mesmo a 7000 rpm ele não fica agudo, é uma fera urrando, sem histeria, mas com fúria. Na minha cabeça é o mugido de um bizão com hidrofobia, o rugido de um tiranossauro rex, de algo grande e bravo, enfim. Mesmo temendo o muro não consigo disfarçar o sorriso dentro do capacete. Quinta de novo na entrada dos boxes e aqui está a linha de chegada.

Acho que o carro tinha mais a oferecer com pneus mais amigáveis. Eu dei tudo o que consegui até ali, definitivamente parecia ter sido minha melhor volta mas a dúvida ficou na minha cabeça nas duas voltas que dei para refrigerar o carro.

Cheguei aos boxes e confirmei a volta em 2'07"6, nada espetacular para um carro de corrida mas 4 segundos mais rápido do que haviam virado com ele até aquele dia. Uma sensação de missão cumprida me invade. Foi esse o fim de um dos dias que mais me diverti na minha vida, com certeza o melhor dia relacionado a carros, de longe. Perdi a minha virgindade com o 911 e fiquei viciado. Preciso ganhar dinheiro para comprar o meu, que pode ser usado, com cara de inofensivo, azul marinho e sensacional como este. Espero que todos nós consigamos o nosso, porque sinceramente, já andei em carros mais rápidos mas nenhum chegou perto do envolvimento que o 911 me proporcionou. Virei fanático. Ver um 911 na rua não é mais a mesma coisa. A saudade é um sentimento forte.

Se achando o máximo ao lado do mito

Ficha técnica resumida:
modelo: Porsche 911 Carrera 4
ano de fabricação: 2000
Potência: 300 hp a 6800 RPM
Torque: 350 N.m a 4600 RPM
Peso: 1350kg
Transmissão: Integral, cambio manual de seis marchas
Desempenho: 0-100 em 5,2s, velocidade máxima 280 km/h
Consumo: vá comprar um 1.0!!!








segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Primeira especial do primeiro rally

Era primeiro semestre do ano 2000. Eu, meu grande amigo Alexander e mais um figuraça da Poli, o Max, embarcamos no Defender do Alex rumo a Curitiba, de manhã bem cedinho. Depois de uma viagem tranquila a bordo do Land Rover apesar de alguns duelos com um afoito Mercedes 608 nos trechos de serra, chegamos a Curitiba. Nosso objetivo era assistir o mais tradicional rally do Brasil, o Rally da Graciosa, que naquele ano também era etapa do sul americano de rally.

Primeira tarefa, achar o rally, não lembro direito como mas acabamos chegando ao local da vistoria do rally. Eu nunca tinha visto um carro de rally de verdade na minha vida fiquei embasbacado, era como estar andando dentro de um sonho, Subarus, Lancers e um Celica maravilhoso. O ronco dos carros em marcha lenta, carros de competição estacionados na rua, andando pelas ruas. Aquilo era bem mais legal do que eu via em Interlagos... Todo mundo conversando, pudemos andar no meio dos carros, conversar com pilotos, conhecemos o Anderson Nobre, na ocasião o big boss do rally no Brasil, nos recebeu, contou como preparar um carro, claro que com um pouco da empáfia tão irritantemente comum no automobilismo, mas em um nível bem aceitável. Resumindo, grana pra correr não tínhamos mesmo.

Pegamos um panfletinho do rally e fomos reconhecer o terreno. Primeira parada: Estrada da Roseira, onde seria realizada a especial noturna naquele dia. Percorremos o trajeto da especial e lembro de me impressionar com a estradinha de asfalto, travadíssima, coisa que nunca tinha visto na região onde fui criado. Ribeirão Preto está em uma região plana e as estradas secundárias não são tão sinuosas, essa é a vantagem de trecho de montanha como Curitiba, a agricultura não dá dinheiro, mas quem está em um carro se diverte de verdade. Voltando à estradinha, ela era estreita, o asfalto era bom, parecia ter sido transplantada da Europa direto para o Paraná, eu já consegui visualizar os carros andando de lado por aquelas curvas, a ansiedade era grande.

Quando percebemos que o sol já estava baixo começamos a procurar o melhor lugar para assistirmos a prova, escolhemos uma sequência de esses que incluía uma pontezinha sobre um riacho, tudo isso ao final de uma grande reta em descida. A noite foi caindo e acabamos puxando papo com uma dupla de uruguaios que ostentavam orgulhosamente sua bandeira por cima de sua S-10 vermelha, eram pai e filho, "Motores y algo más" era o programa de rádio em Montevidéo que era apresentado pelo filho.

Para fechar a estrada para a realização da especial começaram achagar os policiais militares que em um arroubo de conhecimento geográfico saldaram: " Aeee argentina!!!" No que os uruguaios responderam "Aee Milico!!!" e logo nos perguntaram " Como habla milico?" E nós: "Milico? É Milico" para espanto dos chicos.

"E esse negócio de rally não vai começar?" Pensei eu. Logo escutei ao fundo aquilo que pareciam ser rojões, no auto da minha ignorância pensei que era por causa da largada, tipo Fórmula Truck. Gordo tosco.

Escutei os uruguaios murmurando um... "Subaru o Mitsubishi... él alivio del turbo, antilag" disseram(??). Comecei a perceber que os rojões eram entremeados por ronco de motor, cada vez mais alto... quando parava o ronco, rojões.... ANTI-LAG!!!! Sim!!! Os carros de rally tem um sistema que mantém a rotação do turbo através de explosões de combustível no escapamento, era isso que eu estava ouvindo...

Era dez mil vezes mais empolgante que bateria de escola de samba. O barulho foi se aproximando, mais uns rojões, bem próximos agora, e... CLARÃO!!!! Eu não enxergava mais nada, meus olhos doíam até o crânio. Sabe aquele monte de faróis que os carros de rally ostentam no capô? Eles funcionam muito bem!!! E se você for um pós adolescente empolgado e ficar olhando o carro de rally aparecer por de trás das árvores atribuirá um novo sentido à palavra ofuscamento.

Nem vi o primeiro carro passar porque via manchas multicoloridas em qualquer lugar que eu apontasse os olhos... Só ficou o perfume da avgás lembrando que cavalo chique come capim de primeira.

Depois os carros foram passando criando um certo padrão no som conforme desciam a reta e freavam para os esses, quatro cilindros turbo não fazem o som mais bonito mas pra mim eles adquiriram um grande valor sentimental neste dia, assim como os estouros do anti-lag system.

Até que em um dado instante um carro aparentemente freou no meio da reta, não entendemos, logo em seguida pé em baixo de novo para culminar em estouros do anti-lag, pneu travando e um som horripilante de galhos se quebrando, definitivamente um carro de rally tinha saído da pista de maneira pouco amistosa.

Passados os carros restantes fomos lá conferir os estragos, piloto e navegador conversavam com os policiais, ambos bem, Rosiak, era o argentino desmatador, se não me engano. O acidente aconteceu porque eles adotaram um poste com transformador como referência de freada para o final da reta, o piloto achou tê-lo visto no meio da reta e tirou o pé, o navegador, sem ainda ter visto o famigerado transformador soltou um "dá-lhe!! dá-lhe!! dá-lhe!!" . No final os dois só perceberam que tinham feito besteira quando o farol iluminou a vegetação ao final da reta, não deu para fazer nada.... foram parar uns 30 metros mato a dentro abrindo uma estrada por um emaranhado de árvores com troncos de uns 15 cm de diâmetro, não eram jequitibás rosa mas também não eram cana de açúcar, o pobre Lancer Evolution IV até que aguentou bem o tranco e tentava rastejar para fora mas sem sucesso.

Tentamos ajudar com o Defender e vínhamos fazendo progresso no resgate com o guincho até sermos escorraçados gratuitamente por um babaca da organização com uma Hilux que parecia saída de Ruanda, ficou faltando um "Vai se foder junto com a sua mãe!!" para aquele cara, que eu espero que seja entregue algum dia.

Foi esse meu primeiro contato com rally, foi assim que fui infectado com o "velocius poeirentus", vírus incurável que me meteu em um monte de histórias loucas que irei publicando aqui com o tempo.